O ar-condicionado que o brasileiro usa não é eficiente nem aqui, nem lá na China. O produto não entra no mercado chinês, pois não atende às exigências locais. O pior é que como a temperatura do planeta só aumenta, ele pode deixar de ser um luxo para virar artigo de primeira necessidade – como os aquecedores em países muito frios. Estima-se que o número de aparelhos em todo o mundo suba das atuais 1,6 bilhão de unidades para 5,6 bilhões até 2050, de acordo com o último relatório da Agência Internacional de Energia (IEA). Esses quatro bilhões a mais vão demandar mais energia. E quanto mais se produz energia, mais a temperatura sobe. Como evitar uma sobrecarga?
Segundo um estudo recém-divulgado pela Sustainable Energy for All (SEforALL), o aquecimento global põe em risco as vidas de mais de um bilhão de pessoas, que não têm acesso a condicionadores de ar e a geladeiras. Com a crise no Brasil, mal sobra dinheiro para comprar comida; o que dirá um eletrodoméstico que ainda custa tão caro? A solução mais óbvia é adotar políticas para reduzir o custo do aparelho e o consumo de eletricidade, para o calor não subir tanto.
Historicamente o governo brasileiro sempre preferiu – muitas vezes por razões que até o diabo duvida – investir em mais geração de energia do que em redução de consumo. E não há melhor forma de economizar eletricidade do que apostar em eletrodomésticos que gastem menos. É aí que entra a tal da eficiência energética. O país devia ter feito a revisão dos seus índices há dois anos; e, mesmo com esse atraso todo, desde maio a portaria que estabelece os novos parâmetros aguarda pela assinatura do ministro da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações para entrar em vigor. E olha que esses índices ainda estão bem longe do ideal. Vamos ter que correr atrás desse prejuízo.
No ranking da eficiência energética, o Brasil é o vigésimo entre os 25 países que mais consomem energia no mundo, segundo a 4ª edição do International Energy Efficiency Scorecard, do American Council for an Energy-Efficient Economy (ACEEE). Itália e Alemanha empatam em primeiro lugar, com 75,5 pontos de 100 possíveis, seguidos por França, Reino Unido e Japão. No relatório fica claro porque ocupamos uma posição tão vexaminosa: a Alemanha investe por ano mais de US$ 2,5 bilhões em eficiência energética (US$ 31 per capita) e a Itália, mais de US$ 1,5 bilhão (US$ 25), enquanto o Brasil investe só US$ 191 milhões (US$ 0,94).
O ar-condicionado já é o segundo maior consumidor de eletricidade no Brasil nos setores doméstico e comercial. De acordo com a Empresa de Pesquisa Energética (EPE) do Ministério de Minas e Energia, vai responder por mais de 18% do consumo elétrico das famílias em 2024. Como não costuma ficar ligado o tempo todo, o eletrodoméstico também causa picos de demanda. Isso acaba forçando o acionamento das termelétricas – segundo a Agência Internacional de Energia, ele será responsável por 31% do pico de carga residencial em 2050.
E quanto mais se usa energia poluente, como as usinas movidas a carvão, mais o planeta esquenta. Para suportar o calor de hoje, estamos correndo o risco de não conseguirmos cumprir as metas com as quais nos comprometemos no Acordo de Paris. O Lawrence Berkeley National Lab, do Departamento de Energia dos EUA, calculou que uma melhoria de 30% nos índices de eficiência energética significaria a redução de 23% das emissões de gases do efeito estufa pelo setor elétrico brasileiro até 2050. Sem contar que energia de termelétrica custa mais caro e isso se reflete diretamente na conta de luz.
Em países como China, Coreia do Sul, Japão e EUA, o aumento de eficiência energética em eletrodomésticos é política pública. São estabelecidas metas que visam não só reduzir o consumo, como também promover a inovação tecnológica. Assim, a indústria tem como se preparar para atingir – ou até mesmo superar – essas metas. O resultado desse planejamento são custos de produção – e de comercialização – mais baixos, o aumento contínuo da eficiência e, não menos importante, os ganhos ambientais. Porque não é só no Brasil que as coisas estão fervendo.
As recentes ondas de calor mataram mais de 50 pessoas no Canadá e mais de 40 no Japão, onde os termômetros chegaram a bater os 41,1° C: “É como viver numa sauna”, resumiu Yuriko Koike, governadora de Tóquio. Para se ter uma ideia, o calorão que atingiu a Europa na semana passada chegou a áreas próximas do Círculo Polar Ártico. Na última quarta-feira (18), as temperaturas ultrapassaram os 30°C em regiões onde costuma fazer frio o ano inteiro. Na Lapônia, região no extremo norte da Finlândia, onde se acredita que more o Papai Noel, o termômetro marcou 33,4°C. Periga o bom velhinho pedir um ar-condicionado de presente de Natal.
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