Parece que foi ontem. A tragédia de Mariana está fazendo dois anos, mas para as vítimas do maior desastre ambiental do país, é como se tivesse se passado só um dia: ninguém foi julgado, indenizações não foram pagas, o Rio Doce continua morto e cerca de mil pessoas ainda não receberam suas novas casas. Mais de 700 dias se passaram, mas o luto dos 540 Krenak não tem dia para passar, desde que 34 milhões de metros cúbicos de lama tóxica tomaram o rio que chamam de Uatu e praticamente extinguiu sua cultura. As crianças hoje aprendem a nadar em caixas d’água e os remédios, tirados da flora nativa, agora precisam ser comprados em farmácias. As cerimônias à beira do rio acabaram e houve quem morresse de depressão, tamanha a tristeza.
Morando provisoriamente em Mariana, em imóveis alugados, famílias atingidas pelo desastre dos distritos rurais de Paracatu e Bento Rodrigues, além de enfrentarem a incerteza, chegam a ser hostilizadas por locais. E devem esperar ainda mais dois anos até que suas novas casas fiquem prontas. O desemprego no município saltou de 5% para 23% desde que as atividades da Samarco foram suspensas. A lama virou poeira tóxica e está espalhando doenças pela região. Os doentes não recebem tratamento adequado: às vezes, mães precisam escolher qual filho levarão ao médico. Em novembro do ano passado, a Justiça Federal em Ponte Nova (MG) aceitou a denúncia do Ministério Público Federal contra 22 pessoas e as empresas Samarco, Vale, BHP Billiton e VogBR pelo rompimento da barragem de Fundão. Mesmo com responsabilidade comprovada, ninguém ainda foi condenado. Brechas na lei congelam o tempo em Mariana.
Samarco e suas controladoras (Vale e BHP) criaram a Fundação Renova para fazer o trabalho social, o de reconstrução e o de restauração ambiental. A previsão é que remoção de resíduos acabe em 2020, e que R$ 2 bilhões sejam pagos em indenizações, mas ainda não se tem a real dimensão do tamanho do desastre. O equivalente a 120 navios petroleiros de lama desceu 55 km do Rio Gualaxo do Norte e mais 22 km do Rio do Carmo até ambos desaguarem no Rio Doce. De lá, rumou para o mar, no município de Regência (ES), percorrendo ao todo 663 km. Não dá para saber ainda qual será o tamanho do estrago no litoral, já que a foz do rio continua a despejar rejeitos. A única certeza a respeito de Mariana é que não devemos esquecer dela, para que tragédia igual nunca se repita.
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